terça-feira, janeiro 24, 2006

Minha Janela

Do mal em ver a cidade se contorcendo dia após noite.

" - No quarto, ao lado da cama, preso num pequeno espaço, sem opção de fuga. Nesta jaula, não posso tocar meu violão, não posso falar alto, não posso rir nem chorar. Tenho apenas minha janela.
Ruídos temperados de imagens isoladas, que ecoam na aspereza dos alarmes, sirenes, cercas elétricas, cacos de vidro, paredes blindadas, espingarda, concreto e asfalto.
Só tenho minha janela. Contemplando-a passo meus momentos de inspiração. Por isso escrevo de forma doentia, por isso não tenho leveza,
Como a leveza da criatura da noite, que flutua acordada pela madrugada.
Minha prisão,
Meu lamento.

Qual é este lamento
Que por anos sustento?
Quais questões me pertencem?

O quê justifica o sangue que escorre na esquina?"

Neste momento ele levanta seu corpo estático e contempla a vista novamente. Ouve ecoar nas paredes dos edifícios o som de um morcego que desloca-se pelas ruas e avenidas da cidade.

O sanguessuga plana sobre teu dormitório,
Ele acorda nesta noite refrescante de verão,
Irrompe no monumento de pedras, a colméia,
Sedento.
Suas entranhas imploram por sangue. Sangue morno.
Ele voa sobre o emaranhado do sistema.
Sua sede não é saciada com pouco,
É uma luta contínua de vida,
Noite após dia,
Tenta sugar o mais denso leite vermelho,
O mais amargo,
O mais promíscuo,
O MAIS VIL!

Voamos juntos,
Percorremos os mais escuros becos,
Conhecemos o antro mais sujo da cidade,
A saída do esgoto,
A moradia dos ratos prometidos,
Engordando e mutiplicando-se para a noite apocalíptica, no dia de ser a praga.

Somos uma parte necrosada da imensa criatura.
Nós somos apenas um fardo em seu crescimento.
Somos o câncer desta imensa massa disforme.

" - Que tortos caminhos me carregam?
(Pra onde vou, assim com pressa?)
(Pra onde vai toda essa pressa?)

Só espero mais um dia acabar,
Só espero o pôr do sol,
O descanso da alma,
Uma noite de sonhos.
Para em seguida outro dia nascer, assim sucessivamente.
Imploro por um pequeno sonho."

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