terça-feira, outubro 13, 2009

Melancolia

Hoje foi um dia triste. O dia em si não foi triste, na verdade foi um dia que poderia muito bem ter sido um dia feliz, um dia normal, como outros dias. Mas no fechar das cortinas o dia acabou resultando triste, algumas coisas aconteceram deixando o panorama da existência mais triste.

É triste ouvir de alguém que um projeto que foi desenvolvido com muito carinho, por muito tempo, algo que parecia tão importante, não significou nada. Quando, na verdade, quem tem que fazer esse projeto significar é ele mesmo, transmitindo para outras pessoas, difundindo pelo mundo afora, só assim tem resultado. Talvez não o estudante experimental, que está provando esses caminhos estéticos e dramáticos todos apenas para entender alguams coisas, como entender a vida, por exemplo. Mas sim aquele que está se atirando de cabeça à arte.
É duro ver alguém talentoso, um artista nato, tendo que levar uma vida por outro caminho, completamente separado da arte, da expressão artística, por não ter nenhuma condição de largar tudo por uma vida tortuosa e difícil.
Às vezes as pessoas esperam coisas concretas, realizações materiais e imediatas de algo que é fluido e intangível. É difícil compreender o crescimento, o desenvolvimento da própria alma e da vida através de algo que não responde com resultados imediatos, materiais e palpáveis.

Viver de arte não é ter resultados imediatos. Viver de arte é se conhecer, se aventurar numa incógnita que está perdida dentro de si, é explorar essa incógnita, esse lugar desconhecido do meio de nossas almas. Viver de arte é saber olhar o mundo à sua volta. Olhar os detalhes e também olhar o todo, medir esses dois valores, experimentar.
A arte é inexplicável, incategorizável, indescritível, apesar de muito se tentar descrevê-la, sistematizá-la, medí-la.
É muito difícil cumprir espectativas concretas e materiais em cima de algo que depende completamente de uma paixão, de uma entrega incondicional. E cujo resultado seja algo inpalpável, intocável concretamente, matéria de sonho.
É muito difícil entregar-se ao incerto.

O mais curioso é que, vendo uma pessoa próxima questionar porque ela vem se esforçando tanto, dando tanto de si pelo cinema e tendo tão pouco resultado, eu também fico meio abalado. Não que eu vá desistir como ele, não, nem cogito essa hipótese. Já pensei nisso outras vezes, claro que já pensei em desistir, muitas vezes, não poucas, mas não dá, não quero, eu amo o que faço. Não que não pudesse fazer outras coisas, claro que poderia, muitas outras coisas, música, artes plásticas, biologia, letras, filosofia, sei lá, acho que eu gostaria de fazer várias outras coisas, além de cinema, mas isso é o que mais gosto, e acho que é onde tenho mais talento. Porém é um campo muito incerto, e que depende de um talento que vai além do talento artístico de filmar, um talento social, um talento de se saber vender, distribuir seu trabalho, negociar seu trabalho, saber quanto vale o desenvolvimento do seu intelecto para transformar uma idéia em um filme, ter uma auto estima forte, saber se posicionar. E isso não vale só para o cinema, isso está em muitas outras profissões também.
É difícil constatar o crescimento através da arte, é difícil ver, sentir, observar esse crescimento.

Se eu desistisse a cada passo mais difícil que dou, a cada trabalho que não dá resultado concreto, a cada pequeno obstáculo dentre esses milhares de obstáculos que temos que transpassar a cada semana... se qualquer pequena dificuldade já me derrubasse do cavalo não teria feito nada.

Mesmo as oportunidades que tive na vida, as mais simples, fáceis de aceitar e tocar adiante. Como ser advogado, que era algo simples, fácil, que estava nas minhas mãos, já que eu tinha possibilidade de cursar uma faculdade de direito, advogados na família, possibilidades de trabalho, um caminho para seguir já bem delineado. Teria sido muito, mas muito fácil me tornar um advogado.
Porém o mais difícil para mim foi protelar meus sonhos. O mais difícil foi não arriscar e tentar fazer as coisas do meu jeito, mesmo que eu não soubesse o que era meu jeito. Quando desisti de seguir com direito eu simplesmente não sabia o que faria da vida, não tinha a menor idéia. Cinema me apareceu como uma loucura, algo que eu sempre quis fazer mais nunca achei que fosse um caminho profissional.

Me lembro quando tinha 16 anos, estava no colegial, e disse para o meu pai que queria estudar música, que queria ser baixista profissional. Meu irmão, por incrível que pareça, me encorajou muito, me apoiou, disse que eu teria futuro nesta área (e, modéstia a parte, eu era um baixista com um puta potencial, tocava pra cacete e tinha jeito pra coisa). Meu pai me desencorajou completamente, disse que não dá para viver de música, que eu iria passar por muitas dificuldades, que, se um dia o país tivesse uma crise os músicos, assim como os atores e pessoas do entretenimento, são os primeiros a serem descartados. Que as verdadeiras profissões são aquelas que existem mesmo em tempo de guerra.
Estudei direito por 8 meses, cheguei a estudar para fazer medicina. Mas mudei de foco, desisti dessas áreas e me atirei às incertezas, à incógnita.
Seria um desperdício se eu me tornasse um advogado, um médico. Acho que eu seria bom mesmo é como músico, mas nunca me esforcei o suficiente nesta área, nunca tive coragem de me entregar. Em parte por ter sido brutalmente desencorajado, mas a culpa é só minha, eu sou o único responsável por minhas escolhas, e acho que escolhi bem, e não foi uma escolha fácil.

Acho engraçado também um sujeito, num escritório de um dos meus clientes, que olha para mim, vê meus trabalhos, e diz que tenho uma vida fácil, que ele tem inveja de mim, que também queria trabalhar com audiovisual. Se é tão fácil, e se é algo que ele quer, porque não parte para essa vida?
Acho que ele tem medo. Um medo que até eu sinto às vezes, aliás, muitas vezes. Nunca achei tranquila essa minha opção profissional, mas é um medo saudável, que te faz entender muita coisa. Se não existisse esse medo não teria graça.

Se não rolar um friozinho na barriga o que mais importa?